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Envelhecer trabalhando?



Este tema sempre vem à tona quando se discute a questão do trabalhar. Muitas questões correlatas emergem. A primeira, sempre com vistas à proteção do desenvolvimento das crianças e adolescentes é que seja possível que, neste período, vivam intensamente para aprender e se qualificar, não apenas para viver em sociedade, mas também para produzirem, para serem úteis e para adquirirem competências para poderem se sustentar e a seus próximos. A vida adulta seria caracterizada por um intenso processo de produção, cada um contribuindo com o seu trabalhar, exercendo algum papel socialmente útil. Após trabalhar durante um longo período da existência, seria possível se aposentar e usufruir de momentos em que a sua contribuição fora reconhecida e a pessoa teria condições de fazer algo que não esteja necessariamente regido por relações de trabalho reconhecidas pela sociedade. Enfim, ao final do processo, a morte chega.

Esse ciclo de vida é desigual em muitos sentidos, mas como o foco é o trabalho, trata-se da desigualdades existentes no trabalho que possam propiciar melhores cenários para que as pessoas possam se desenvolver e construir uma vida significativa. Ao pensar em cenários de trabalho, considere-se que ao comparar diferentes situações, estamos viajando no tempo e no espaço. Ao nos deslocarmos em uma mesma cidade, estado ou país; ou ainda, entre diferentes países, nos deparamos com cenários de trabalho que correspondem à contemporaneidade, assim como aqueles que são bastante próximos de tempos muito de antão. Ainda, situações de grande risco de acidentes e de adoecimento (insalubres) também coexistem com situações aparentemente seguras e sãs. Evidentemente que há situações de trabalho que podem ser consideradas como propícias para o desenvolvimento das pessoas e da cultura.

Como está no título, o grande desafio é envelhecer trabalhando. O que seria envelhecer? Envelhecemos quando estamos velhos? Longe disso, a cada momento da vida, envelhecemos em todos os sentidos, biológico e socialmente falando. Sempre podemos ser considerados “velhos” por aqueles que concebem, definem e gerenciam as situações de trabalho. Isto ocorre em qualquer idade, mas podemos considerar que há mais “risco” de sermos considerados “velhos” a partir de um dado momento que, também varia em acordo com o tipo de produção aonde estamos inseridos. Ser considerado “velho” com 25-30 anos é algo cada vez mais presente, por incrível e absurdo que isso possa parecer. Aqueles que não conseguem mais doar sua força de trabalho para que possa dar conta das tarefas que lhe são alocados podem ser considerados ultrapassados, portanto velhos, para continuar naquela organização.

Tornar-se descartável é uma sina que nos acompanha ao longo da vida, em muitas situações o período de vida útil pode ser extremamente curto se compararmos à longevidade da vida que, aliás tende a ser cada vez maior. Entre gerações, sobretudo no século XX da nossa era, houve acréscimos de muitos anos, por vezes chegando a 30 anos entre uma geração e outra. Tudo isso graças aos avanços das técnicas, sejam elas no âmbito da sanidade ambiental, das condições de vida, das ciências da saúde, das técnicas e, por que não, de melhorias em determinadas situações de trabalho.

Isto traz um dilema, algo que está cada vez mais presente no debate social. Se vivemos mais, podemos trabalhar mais? Podemos nos aposentar mais tarde? Fora de contexto, essas questões são muito simplificadoras e não dão conta da realidade. O que de fato importa são as condições de criação, manutenção e. mesmo de desenvolvimento de pactos sociais que deem conta de diferentes aspectos da produção e do trabalho. Não se trata de uma questão que diz respeito a uma empresa, a uma representação sindical ou a alguma instituição do Estado. Trata-se de uma questão que reflete graus de solidariedade e de preocupação com o bem-viver do conjunto da população, uma vez que estão em jogo, não apenas a sobrevivência e a reprodução dos humanos, mas também a possibilidade de ter uma vida significativa.

Portanto, há que se pensar no trabalho, sobretudo a partir dos pressupostos das ciências do trabalho; em especial, os da psicodinâmica do trabalho e da ergonomia, que o trabalho é central na vida das pessoas e que este deve propiciar condições para o seu desenvolvimento, pessoal e coletivo. Isso significa que os cenários de trabalho devem ser propícios para o envelhecimento, tanto no que diz respeito à perda de certas propriedades, como a força física e a agilidade da memória, como no que diz respeito, ao reconhecimento da experiência acumulada e sua contribuição para produzir. Todavia, encontramos cada vez mais cenários, onde a influência do ideários neoliberal é muito prevalente que são verdadeiras máquinas de fazer “sucata humana”. Rapidamente as pessoas se tornam pouco produtivas aos olhos de quem está no comando as ações em diferentes organizações, portanto, são descartáveis. Felizmente isso não uniforme e nem se trata de uma regra de ouro; há situações de trabalho que permitem às pessoas trabalharem em condições de desenvolvimento e aprimoramento. Apesar de não serem as mais prevalentes, são exemplos nos quais cada um, em conjunto com os outros, podem continuar a contribuir ao longo de um período longo de sua existência. Em geral, trata-se de situações que respeitam alguns pressupostos fundamentais defendidos por nós; aqueles que consideram o trabalhar como, efetivamente, uma atividade profissional. Isto significa que é possível trilhar uma vida profissional, produtiva, consequente, significativa onde a contribuição de cada um, considerando-se tanto seus potenciais como limitações seja considerada e reconhecida nas organizações.

Entender que não há determinantes únicos e definitivos na vida em sociedade é o primeiro passo para se criar condições para que as pessoas possam envelhecer trabalhando. Há sempre que se considerar aspectos da seguridade social que são fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Como já dito anteriormente, não se trata de algo da responsabilidade exclusiva de uma única empresa, mas da institucionalização e do reforço daquilo que já existe na sociedade para ajudar na estruturação e regulação das relações sociais, sobretudo as do trabalho. Instituições públicas, para-públicas, organizações não-governamentais, sindicatos de trabalhadores e de empregadores tem uma papel a cumprir. No âmbito do Estado, aquilo que diz respeito ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário também tem uma significativa influência com relação às questões aqui tratadas. O mais importante é que fique evidente e reconhecido que as pessoas vivem momentos distintos na sua existência e que é primordial a construção de pactos sociais para que haja efetivamente a possibilidade de desenvolvimento das pessoas, das instituições e da cultura. Por isso, a possibilidade de inscrição de todos em uma determinada profissão é de suma importante para a construção da longevidade. Isso não significa uma amarra ou uma prisão, pelo contrário, fazer parte de alguma profissão é fundamental para que as pessoas possam se sentir mais competentes e fazendo coisas úteis e belas.

Os “anciãos da tribo” tem um lugar na sociedade e podem trazer contribuições significativas para a produção de bens e serviços!

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